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“Quem me chama de desenvolvimentista está me ofendendo” O economista da Unicamp Luiz Gonzaga Belluzzo, ex-professor de Dilma Rousseff, se diz um "keynesiano marxista" e propõe um pacto entre governo, trabalhadores e empresários para o país enfrentar a crise

Um dos principais interlocutores do ex-presidente Lula no governo do petista, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, de 72 anos, tornou-se um duro crítico da política econômica da presidente Dilma Rousseff e do ajuste fiscal proposto pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Segundo Belluzzo, o corte de gastos públicos fará a recessão se aprofundar no país, com efeitos perversos no emprego. Para reduzir o impacto da crise, ele propõe a negociação de um pacto social entre governo, trabalhadores e empresários. “O ajuste pode trazer muita inquietação social, e isso não é bom”, afirma.

Ex-presidente do Palmeiras e professor aposentado da Universidade de Campinas – foi professor de Dilma durante seis anos –, Belluzzo hoje é sócio e diretor da Facamp, uma escola que oferece cursos de economia, administração e engenharia, além de MBA executivo, também em Campinas. Embora considerado um “desenvolvimentista”, Belluzzo se declara “keynesiano marxista”. “Quem me chama de desenvolvimentista está me ofendendo”, diz.

ÉPOCA – No ano passado, o senhor apoiou a reeleição de Dilma, mas tem feito duras críticas ao governo. Em sua opinião, Dilma traiu suas propostas de campanha?
Luiz Gonzaga Belluzzo – Outro dia, o economista Alexandre Schwartsman escreveu um artigo dizendo que critico o governo porque estou com dor de cotovelo. Meu cotovelo tem algumas peculiaridades. Uma é que reservei todas as dores para as mulheres que amei, tendo meus sentimentos sido correspondidos ou não. Fora isso – como joguei futebol, e muito bem –, reservei meu cotovelo para os zagueiros que tentavam me acertar. Não tenho dor de cotovelo porque minha suposta aconselhada mudou a política econômica, mas me reservo o direito de dizer o que penso. O que houve foi que a presidente Dilma cedeu a propostas conservadoras. Está submetida a um processo de desgaste intenso e não teve forças suficientes, pelas circunstâncias, para enfrentá-las.

ÉPOCA – O senhor assinou um manifesto de intelectuais e ativistas contra a indicação de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda e as medidas de ajuste fiscal. O que aconteceu? O senhor passou para a oposição?
Belluzzo – Não estou fazendo uma crítica pessoal ao Levy. Já almocei com ele algumas vezes. Tivemos conversas de alto nível. Mas discordo da ideia de que é possível fazer um ajuste fiscal com a economia desacelerando e os juros em alta. Como a arrecadação do governo depende do nível de atividade econômica, você acaba piorando as coisas. Quando o Banco Central sobe os juros, afeta diretamente a dívida pública. Aposto que ela passará de 70% do PIB (Produto Interno Bruto) neste ano (em 2014, ficou em 63,4% do PIB). Mesmo se o governo cumprir o superavit fiscal prometido para 2015, de 1,2% do PIB, o que é difícil, não vai evitar o impacto negativo dos juros sobre o estoque da dívida. A consequência disso é que o PIB vai cair de 1,5% a 2% no ano e o desemprego vai aumentar. Se acrescentarmos a isso a situação da Petrobras e das empreiteiras, o efeito na economia será dramático. Somados, os investimentos da Petrobras, de seus fornecedores e das empreiteiras representam mais de 10 pontos percentuais da taxa de investimento brasileira (cerca de 17% do PIB em 2014), que é baixa, se comparada às de outros países emergentes.

ÉPOCA – Com o quadro atual, de desequilíbrio nas contas públicas, inflação alta e deficit recorde nas contas externas, dá para usar “homeopatia” para pôr a economia nos trilhos?
Belluzzo – Como diz o velho ditado “devagar com a louça porque o santo é de barro”. Não estou dizendo que não precisa reequilibrar as contas públicas, redistribuir melhor o gasto, mas acredito que o ajuste fiscal agravará a recessão. Dependendo da dose, poderá gerar resultados contrários ao que deseja obter. Nossa situação fiscal não é desastrosa. É ruim, inconveniente, mas não o desastre que o mercado desenha. Não é nada parecida com a situação de Grécia, Itália, Espanha, Irlanda e Portugal. Pode até ficar, se a gente continuar no mesmo ritmo, mas ainda está longe disso. No Brasil, esse consenso catastrofista chegou a tal ponto que perdeu a relação com a realidade. Se o governo quiser fazer um ajuste, que faça, mas leve em conta que, se a economia desacelerar muito, não conseguirá nada.

Leia a entrevista completa publicada na revista Época