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“O animal humano precisa de descanso” Para o filósofo e escritor suíço Alain de Botton, a rotina que vivemos hoje é dura demais para a maioria das pessoas

O filósofo suíço radicado em Londres Alain de Botton é herdeiro de uma grande fortuna. Mas, no início dos anos 90, por um desses caprichos que os milionários costumam ter, decidiu não usar o dinheiro da família e viver apenas dos ganhos que teria como escritor. Hoje, pode se gabar de ter alcançado seu objetivo. De Botton ajudou a popularizar a filosofia e a divulgar seu uso na vida cotidiana. Vários dos nove livros que escreveu, sobre temas que vão do amor à arquitetura e à arte de viajar, tornaram-se best-sellers. Nesta entrevista, ele fala sobre os prazeres e desprazeres do trabalho, tema de seu último livro, recém-lançado no país. Segundo De Botton, as pessoas trabalham hoje mais que nunca e vivem uma rotina difícil de administrar. “O animal humano precisa de descanso”, diz.

ÉPOCA – É possível ser feliz no trabalho?
Alain de Botton – Sim, assim como é possível ser feliz no amor. Todos nós conhecemos pessoas que têm relacionamentos maravilhosos. Conhecemos também pessoas que têm trabalhos maravilhosos. Elas amam o que fazem. Mas é uma minoria. Para a maior parte das pessoas, algo está errado. Pode ser que, em algum momento, as coisas tenham ido bem, mas depois elas acabaram perdendo o interesse no trabalho. Pode ser que as coisas nunca tenham ido bem para elas. Pode ser que exista algo que elas queiram muito fazer, mas não saibam direito o que é. Ou pode ser que elas saibam o que é, mas seja algo difícil de ser alcançado. A ideia de que todos podemos ser felizes no trabalho é bonita. Mas, no atual estado da economia, da política e até da psicologia, isso é impossível.

ÉPOCA – Por que é tão difícil ser feliz no trabalho?
De Botton – Por diversas razões. Pode ser muito difícil saber o que você quer fazer com sua vida. Existe gente que diz “eu quero fazer algo para ajudar outras pessoas”, mas não sabe exatamente o que fazer, nem como fazer isso. Outras pessoas dizem “quero fazer algo criativo”, mas também não sabem como. Há certo mistério para conseguir o que queremos. Há também muitos obstáculos. Qualquer empreendedor, ao abrir seu negócio, terá de superar a inércia do mercado para se estabelecer. Um indivíduo que entrou num novo emprego enfrenta um problema parecido para mostrar ao mundo que ele existe. É uma tarefa difícil, em qualquer ramo de atividade. É sempre algo extraordinário quando alguém ama o que faz – e é bonito ver isso acontecer.

ÉPOCA – O que podemos fazer para ser mais felizes no trabalho?
De Botton – Há muitas formas. Acho que o sistema de educação, em qualquer lugar, não é dirigido para aproveitar os talentos das pessoas. No início do século XXI, ainda não estamos aproveitando o lado mais interessante, mais energético, mais vivo e mais especial de cada pessoa. Precisamos desenvolver um sistema educacional melhor nesse aspecto. Precisamos também encontrar um sistema econômico que nos dê a oportunidade de mostrar o que temos de especial. Em qualquer empresa de grande porte, 80% das pessoas usam só metade de sua capacidade. A outra metade não está envolvida no que faz. Falamos muito hoje em dia sobre o desperdício de recursos naturais preciosos, como o petróleo e a água. Mas falamos pouco sobre o desperdício do recurso mais precioso, que é o ser humano.

Leia a entrevista completa publicada pela revista Época