O advogado Almir Pazzianotto, de 78 anos, é uma das maiores autoridades do país na área das relações do trabalho. Foi advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema, no ABC paulista, nos tempos em que Lula era o presidente da entidade, nos anos 1970 e 1980. Depois, como Lula, ele migrou para a política. Tornou-se deputado federal pelo MDB e por seu sucedâneo, o PMDB, de 1975 a 1986. Foi secretário do Trabalho de São Paulo na gestão de Franco Montoro, ministro do Trabalho no governo Sarney, quando criou o seguro-desemprego, e ministro e presidente do Tribunal Superior do Trabalho, o TST, de 1988 a 2002. Ao se aposentar do TST, Pazzianotto voltou a atuar como advogado. Nesta entrevista, ele critica a atuação do movimento sindical, defende a mudança da Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT, que regula as relações trabalhistas, e diz que Lula e o PT abandonaram bandeiras históricas ao manter o imposto sindical e a vinculação dos sindicatos ao Estado.
ÉPOCA – Nos últimos meses, a CUT e os sindicatos ligados ao PT organizaram protestos contra o ajuste fiscal e as medidas que limitam a concessão de benefícios, como o seguro-desemprego e a pensão por morte. Como o senhor avalia essa reação?
Almir Pazzianotto – O fundamento das medidas é a constatação – já antiga – da existência de abusos na concessão de benefícios sociais e trabalhistas. Inicialmente, eu me opus a elas por terem sido adotadas por meio de Medidas Provisórias. No mérito, acredito que as providências do Poder Executivo estão corretas. É seu dever verificar onde há vazamento e propor medidas para contê-lo. O que falta às centrais sindicais, confederações, federações e aos sindicatos, especialmente a seus dirigentes, é uma posição racional, de equilíbrio. Eles não querem saber das contas. Têm um discurso demagógico. Utilizam-se da democracia – e de uma democracia bastante liberal que há no Brasil – para transformar em manifestação o que deveria ser um grande debate nacional. Não dá para abrir um debate na Avenida Paulista, como se fosse uma assembleia sindical. Outro dia cruzei com um político que respeito muito e ele me disse: “A esquerda no Brasil tornou-se reacionária”. Ele tem toda a razão. A esquerda, de forma geral, tornou-se reacionária. O PT tornou-se reacionário. Não percebe que o Brasil precisa de mudanças profundas, sob pena de ficar para trás no cenário global.
ÉPOCA – Essas manifestações também tinham como alvo o projeto que regulamenta a terceirização, aprovado pela Câmara dos Deputados, por ameaçar os direitos trabalhistas. O senhor concorda com as críticas do movimento sindical?
Pazzianotto – Isso é demagogia explícita. A lei trabalhista não faz distinção entre quem trabalha para uma prestadora de serviço e para uma tomadora de serviços. O argumento mais usado contra a terceirização é o da “precarização” das relações de trabalho, mas até agora ninguém me explicou o que isso significa. Não há vínculo de emprego que seja definitivo. A velha estabilidade aos dez anos de serviço acabou em 1967, com a criação do Fundo de Garantia. Temos algumas exceções na legislação, que confere a estabilidade no emprego aos funcionários públicos e uma garantia temporária para a gestante, o dirigente sindical, o acidentado e o membro da Cipa (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes). O que garante o emprego mesmo – e é isso que nosso obtuso dirigente sindical faz de conta que não sabe – é a situação da economia. Se ela é próspera, o mercado de trabalho se alarga e a lei da oferta e da procura adquire relativo equilíbrio. Se a economia desaba, ninguém segura os empregos.
ÉPOCA – Em sua opinião, por que os sindicatos e as centrais sindicais resistem tanto às mudanças?
Pazzianotto – O que faz os sindicalistas tomarem atitudes irresponsáveis, desprovidas de qualquer razoabilidade, é o imposto sindical, a estabilidade de que eles gozam. A estrutura herdada do Estado Novo não corresponde ao mundo de hoje. As eleições sindicais são uma fraude, porque a adesão na categoria é mínima. As mensalidades são irrisórias. Ninguém se sindicaliza. Como o sindicalista tem sua fonte de renda garantida, não se preocupa com o mercado de trabalho. Hoje, no Brasil, poucos são tão privilegiados quanto essa elite sindical, que não quer perder seus privilégios. Se o Brasil quiser avançar, precisa entender as mudanças. Hoje, a classe operária não tem nada a ver com a de 1950.
Leia a a entrevista completa de Almir Pazzianotto publicada na revista Época
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