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“O problema foi a ganância” O economista americano Peter Bernstein se diz "horrorizado" com a má qualidade de gestão dos bancos internacionais

O economista e consultor americano Peter Bernstein, de 90 anos, é um dos principais estudiosos da questão do risco em todo o mundo. Autor de diversos livros sobre investimentos, ganhou maior visibilidade no fim dos anos 90, quando as crises financeiras internacionais passaram a pipocar por aí, com a publicação de Desafio aos Deuses: a Fascinante História do Risco (Ed. Campus). Nesta entrevista, Bernstein se diz “horrorizado” com as perdas bilionárias sofridas pelos grandes bancos internacionais, em decorrência da crise no mercado imobiliário americano. Segundo ele, foi a ganância que levou os bancos a assumir riscos exagerados em suas operações com hipotecas. “É inacreditável que pessoas com alto grau de sofisticação, de conhecimento e de experiência tenham agido como um bando de amadores”, afirma.

ÉPOCA – No mundo das finanças, fala-se muito sobre risco hoje. O que, na verdade, é risco?
Peter Bernstein – Risco é a tomada de decisão em condições de incerteza. Nunca sabemos o que o futuro nos reserva. Qualquer coisa pode acontecer. Risco não significa possibilidade de perda. Significa incerteza e, portanto, a possibilidade de haver perda ou ganho. Em qualquer situação, há inúmeras possibilidades. Provavelmente, muito mais do que identificamos ou imaginamos que possa ocorrer.

ÉPOCA – Levando isso em conta, o senhor acredita que, hoje, em razão da crise no mercado imobiliário americano, corremos maior risco que no passado?
Bernstein – Não acredito que isso seja mais importante hoje que em qualquer outra época. Nos últimos seis ou sete anos, as pessoas se convenceram – e acho que elas estavam certas – de que estávamos vivendo numa era de riscos bem menores que antes. A inflação estava baixa, o progresso tecnológico era acelerado e a economia se globalizava rapidamente. Países como o Brasil se abriram e muitas coisas interessantes aconteceram. A economia mundial estava realmente maravilhosa. O problema é que, aí, cada indivíduo, de forma inocente e independente, passou a acreditar que nada poderia dar errado e que era possível assumir riscos mais altos que num cenário mais turbulento. Mas, se todo mundo se convence de que o cenário é de baixo risco e que pode assumir mais riscos, o cenário deixa de ser de baixo risco. O resultado é que todos são afetados quando alguma coisa efetivamente dá errado, como aconteceu agora.

ÉPOCA – Numa escala de risco de 0 a 10, em que nível o senhor acha que estamos hoje?
Bernstein – Como disse há pouco, risco significa que qualquer coisa pode acontecer e que nós não sabemos, do leque de possibilidades, qual vai vingar. Dessa forma, não sei se estamos no nível 10. Mas, certamente, estamos bem acima do 5. Até onde eu sei, com base em minha experiência e na história do mercado financeiro, estamos vivendo algo novo. Não passamos antes por uma situação em que o mercado de crédito se estilhaçou. A falta de confiança, a falta de transparência se espalharam. Ninguém sabe como isso vai terminar. A incerteza é muito grande. O cenário está muito arriscado. Os bancos estão tentando colocar a casa em ordem. Quanto tempo isso vai levar e quando os bancos americanos vão emprestar dinheiro de novo é difícil dizer.

ÉPOCA – A alta recente do preço do ouro é uma reação ao risco, sinal de que as pessoas estão procurando investimentos mais seguros?
Bernstein – Em sentido geral, sim. Mas a alta do preço do ouro está mais ligada às cotações do dólar e do petróleo. Ambos estão enviando sinais de perigo (dólar em queda e petróleo em alta). Por três ou quatro anos, tenho dito que cenários extremos tinham se tornado mais possíveis que no passado, por causa do mergulho do dólar. E, portanto, é natural que as pessoas busquem uma proteção para seu patrimônio. Eu odeio a idéia de ver o ouro como investimento. Não acredito que é dinheiro, mas acho que pode servir como proteção, em cenários extremos – e acho que é isso que está acontecendo hoje. É um sinal de como as pessoas do mundo todo estão assustadas.

Leia a entrevista completa publicada na revista Época