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“O corporativismo está travando a democracia” Para o financista Nicolas Berggruen, os grupos de interesse impedem os governos de investir no longo prazo – em áreas como infraestrutura e educação

O financista Nicolas Berggruen fez fortuna em Wall Street. Hoje dedica parte de seu tempo ao ativismo político. Dono de um patrimônio de US$ 2 bilhões, Berggruen, de 51 anos, fundou, em 2010, um centro de pesquisas que leva seu nome, na Califórnia, Estados Unidos, para promover o estudo de novos sistemas de governança. Aproximou-se da nata da social-democracia mundial. Fazem parte da lista de conselheiros de sua entidade os ex-primeiros-ministros Tony Blair, do Reino Unido, e Felipe González, da Espanha, o francês Jacques Delors, ex-presidente da Comissão Europeia, e o ex-presidente brasileiro Fernando Henrique Cardoso. Segundo Berggruen, a governança – um termo do sociologuês que designa a maneira como o poder administra os recursos sociais e econômicos de um país – é o fator determinante, com a cultura, para o bem-estar da sociedade. “A governança faz a diferença”, afirma Berggruen, coautor de um livro sobre o tema – Governança inteligente para o século XXI –, recém-lançado no Brasil pela editora Objetiva, da qual ele detém o controle.

Filho de um rico marchand, cuja coleção incluía obras de Matisse e Picasso, de quem seu pai era amigo, Berggruen nasceu em Paris e tem dupla nacionalidade, alemã e americana. Solteirão, viaja pelo mundo em seu jatinho, um Gulfstream IV, e vive em hotéis cinco estrelas. Famoso pelas festas que promove no Hotel Marmont, em Los Angeles, na véspera da entrega do Oscar, frequentemente é flagrado com modelos e atrizes, como a alemã Claudia Schiffer ou a britânica Gabriella Wright. Nesta entrevista a ÉPOCA, concedida durante uma viagem recente ao Brasil, Berggruen fala sobre o futuro da mídia na era digital, o potencial do mercado de livros no país – ele investe nas duas áreas – e governança global.

ÉPOCA – Em seu livro, o senhor diz que o mundo vive hoje uma crise de governança política. Que crise é essa?
Nicolas Berggruen – A democracia liberal é um sistema que abre espaço para muitas vozes. Isso é muito bom, mas, hoje, no Ocidente, nas democracias mais avançadas, o sistema não funciona como deveria. Nos EUA, os lobbies e o corporativismo predominam: associações patronais, sindicatos, todo tipo de grupos de interesse, de ambientalistas a associações de advogados. Isso é normal na democracia, mas, muitas vezes, acaba impedindo o governo de tomar decisões duras, que não são populares, porém são as mais indicadas naquele momento. Os dois grandes partidos americanos, o Democrata e o Republicano, não estão comprometidos com o futuro do país, mas em defender a si mesmos e em matar um ao outro.

ÉPOCA – De que forma essa crise se manifesta em outras regiões do mundo?
Berggruen – Na Europa – com os EUA, o exemplo mais bem-sucedido de democracia liberal dos últimos 200 anos –, o sistema em que tudo deve ser decidido em Bruxelas também não funciona. Eles criaram a moeda comum, mas precisariam dar mais força ao poder central para o sistema funcionar. Só que seria necessário abrir mão de soberania. Não dá para fazer isso sem legitimidade. No Oriente, a China vive, a seu modo, uma crise de governança. Eles deram poder econômico aos cidadãos, mas não o poder político correspondente. Falta delegação de poder, transparência. Os indivíduos não têm direitos suficientes contra o Estado, contra o partido. O sistema chinês também pode se tornar muito corrupto.

ÉPOCA – Em sua visão, qual seria a melhor saída para essa crise de governança?
Berggruen – Num mundo multipolar, em que não há mais um país hegemônico, não se pode mais advogar a ideia de que um único sistema é bom para todos. Há diferentes sistemas, diferentes culturas, diferentes ideologias. Temos de aprender uns com os outros. Isso é o oposto de mudar de um sistema para outro ou de uma ideologia para outra. Tem de haver crenças, mas elas acabam terminando na ideologia. Num mundo muito mais complexo, pode não ser a resposta certa.

Leia a entrevista completa publicada na revista Época