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“No campo da ética, houve uma decepção com o PT” O presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Dom Raymundo Damasceno, diz que o partido precisa reconhecer seus erros e alerta: a crise política pode tornar o país ingovernável

O cardeal Dom Raymundo Damasceno, arcebispo de Aparecida, São Paulo, está chegando ao fim de seu mandato de quatro anos como presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Aos 78 anos, conta que declinou da indicação à reeleição e que seu substituto deverá ser escolhido na 53ª Assembleia-Geral da CNBB, marcada para este mês. Dom Damasceno também espera a aceitação pelo Vaticano de sua renúncia ao posto de arcebispo de Aparecida, que ele apresentou em 2011, aos 75 anos (como manda o Direito Canônico), ao então papa Bento XVI. “Considero a minha missão cumprida”, afirma. Segundo Dom Damasceno, não cabe à Igreja assumir o papel do Estado ou tomar as rédeas da política, mas ela não pode ficar alheia aos problemas do país. Nesta entrevista, realizada em sua residência, no Seminário Bom Jesus, em Aparecida, ele fala sobre os escândalos de corrupção e a rejeição ao governo e ao PT, esclarece a posição da Igreja em relação à união homossexual e comenta uma possível renúncia do papa Francisco em um ou dois anos.

ÉPOCA – Em março, a CNBB divulgou uma nota em que manifestou sua preocupação com a “situação crítica” do país. O que mais preocupa a Igreja hoje?
Dom Raymundo Damasceno – Nós constatamos que, no momento, há um descontentamento geral da população, sobretudo em relação à crise ética e moral. Ela se manifesta por causa da corrupção, que começou a aparecer em maior escala com o mensalão e depois continuou na Petrobras. A cada dia, aparecem fatos novos, envolvendo pessoas que exercem funções públicas ou são executivos de grandes empresas. Isso acaba desmerecendo o trabalho das pessoas de bem, nivelando-as àqueles que se deixam levar pela corrupção. A corrupção sempre existiu, sempre vai existir, porque faz parte da pecaminosidade da humanidade, mas temos a obrigação de combatê-la e controlá-la ao máximo. É fundamental que, ao receber denúncias sobre determinados delitos, a Justiça cumpra sua missão, julgando e condenando, se for o caso, tanto os corrompidos como os corruptores.

ÉPOCA – No dia 15 de março, as pessoas não protestaram apenas contra a corrupção, mas também contra a presidente Dilma e o PT. Como o senhor vê esse movimento?
Dom Damasceno – Esses escândalos todos de corrupção atingem muitos políticos, mas de modo especial os do PT. Isso está gerando um descontentamento muito grande com o partido e seus representantes. Agora, não podemos generalizar, dizer que o PT é corrupto, que todos os petistas são corruptos, nem ter a ilusão de que as coisas vão melhor repentinamente com a mudança de governo. Uma boa parte das investigações – ainda não comprovadas, evidentemente – está implicando membros do PT, mas também de outros partidos. Isso está fazendo com que muitos jovens se desencantem com a política e gerando até certa revolta com os políticos de modo geral, generalizando tudo, quando não podemos generalizar. Nós precisamos de uma reforma política – a melhor que for para o Brasil – para os homens públicos terem mais representatividade e para ajudar o eleitor a exercer seu direito e a escolher bem seu candidato.

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ÉPOCA – Alguns líderes do PT e do governo disseram que a defesa do impeachment da presidente Dilma representa um golpe. O senhor concorda com eles?
Dom Damasceno – Sem dúvida, as manifestações foram uma forma de protesto contra o governo. É legítimo e faz parte da democracia. As pessoas têm o direito de se manifestar, de fazer reivindicações, suas exigências ao governo. O PT exerceu muito bem a função de oposição no governo de Fernando Henrique Cardoso. Agora, tem de respeitar as manifestações e a oposição ao governo e, sobretudo, ter a humildade de reconhecer falhas, omissões e saber dialogar com a sociedade, com as instituições. É fundamental não se considerar dono da verdade.

Leia a entrevista completa de Dom Raymundo Damasceno publicada na revista Época

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