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FHC: “O Lula tem de explicar qual a responsabilidade dele em todos esses processos” O ex-presidente e líder do PSDB diz que, enquanto não se explicar, Lula "não tem o meu respeito"

Depois de trabalhar como “bombeiro” nas últimas semanas, para abrandar o ímpeto do PSDB em relação ao impeachment de Dilma, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deixou a diplomacia de lado, ao comentar um possível encontro com Lula para alinhavar um acordo que ajude o país a sair da crise política e econômica em que se encontra.

“Eu disse toda a vida ‘na hora que o Lula quiser’. Mas não adianta conversar com o Lula agora. Toda hora aparecem problemas de envolvimento, que chegam próximos ao Lula. Quero ver se ele para em pé primeiro”, afirmou Fernando Henrique, durante encontro com empresários nesta sexta-feira, em São Paulo. “O Lula tem de explicar qual a responsabilidade dele em todos esses processos que estão aí. Enquanto ele não se explicar, não tem o meu respeito. Se ele se explicar, pode ser que me convença de que não tem nada a ver com o que está aí. Mas, enquanto não tiver o meu respeito, eu não falo com ele.”

Ao participar do painel Os desafios do Brasil para as próximas décadas, que contou também com a presença da ex-senadora Marina Silva, da Rede Sustentabilidade, Fernando Henrique disse que só é possível conversar “quando você tem um interlocutor com a mesma boa fé que nós temos”.

Leia o texto publicado no site da revista Época

Ele contou um episódio recente para mostrar o quanto é difícil negociar com Dilma, Lula e o PT. Segundo Fernando Henrique, na época das manifestações de rua, em 2013, Dilma pediu que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, o procurasse para ajudar na reforma do sistema político do país:

– Em um domingo, ele me telefonou. Na segunda-feira foi na minha casa. Ele disse o seguinte: ‘O senhor está disposto a ajudar na reforma do sistema político brasileiro?’ Pois não, estou disposto.

Na conversa, de acordo com Fernando Henrique, ele procurou mostrar a Cardozo algumas questões consideradas essenciais para a negociação ir em frente:

– Primeiro, no PSDB, eu não mando. Posso falar por mim. Tem de conversar com algumas lideranças. Segundo, no seu partido, há uma pessoa que manda – o Lula. O que ele pensa sobre isso? Terceiro, a presidente da República está disposta a coordenar ela mesma o processo? Porque, se não estiver, não vai funcionar. Quarto, dá para a gente fazer isso sem anunciar? Da para a gente ter algum conteúdo antes de anunciar?.

Segundo Fernando Henrique, todos os pontos foram prontamente aceitos pelo ministro. Só que, mesmo assim, a negociação fracassou, antes mesmo de decolar:

– No dia seguinte, eu estava dirigindo, o ministro me telefona. Ele diz: ‘Presidente, vazou’. Claro que vazou. Ontem mesmo o Aécio me ligou perguntando como foi nossa conversa, e não foi por mim que ele soube. ‘Ah, foi por aqui mesmo’.

Fernando Henrique afirma que ainda tentou minimizar o vazamento para não interromper a negociação:

– Disse a ele: qual o problema de ter vazado? Não tem nenhum. Vamos fazer como Golbery (do Couto e Silva, ex-chefe da Casa Civil nos governos Geisel e Figueiredo) fez com Ulisses (Guimarães, ex-presidente do PMDB) ou o Ulisses fez com o Golbery. Eles fizeram um encontro e combinaram que iam negá-lo. Você vai negar, eu vou negar, mas todo vai saber que houve o encontro. Dali a pouco, o Cardozo liga de novo. ‘Não dá para negar, já sabem de tudo’. Aí, eu disse: ‘É verdade. Só que ontem você não falou comigo sobre Constituinte provisória, nem plebiscito’. Ele não sabia de nada. ‘É, o senhor tem razão. A presidente conversou com outras pessoas, teve outras ideias e soltou no jornal’.

Para concluir a história, Fernando Henrique faz uma pergunta:

– Se o interlocutor não consegue entender a gravidade do momento, como você vai conversar?

Ele mesmo responde, como se discutisse consigo mesmo:

– Só dá para conversar quando você tem um interlocutor com a mesma boa fé que nós temos.