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“Ação social é só relações públicas” O professor de Berkeley, Robert Reich, ex-secretário do Trabalho de Clinton, diz que não cabe às empresas fazer o papel de instituições de caridade

Nos últimos tempos, virou uma espécie de sacrilégio criticar as ações de responsabilidade social das empresas. Elas se tornaram tão valorizadas pela sociedade que, hoje, qualquer empresa que se preze precisa ter seu projeto social. Mas, para Robert Reich, autor do livro Supercapitalism, recém-lançado nos Estados Unidos e ainda sem tradução no Brasil, não cabe às empresas fazer o papel de instituições de caridade. “Quem dá aos executivos das empresas o direito de decidir o que é do interesse público?”, diz. “É para isso que temos uma democracia, para determinar as regras do jogo.”

Professor de Políticas Públicas da Universidade da Califórnia em Berkeley e ex-secretário do Trabalho dos EUA, Reich não é um libertário, como o economista Milton Friedman (1912-2006), para quem “a única responsabilidade social das empresas é aumentar seus lucros”. Ele é um pensador de esquerda, conhecido por suas posições firmes em defesa de uma maior distribuição da riqueza americana – e isso dá ainda mais força a suas idéias. “O papel do capitalismo é fazer o bolo crescer”, diz. “Definir como o bolo será fatiado e decidir sobre o que fazer com suas fatias é algo que cabe à sociedade.”

ÉPOCA – Em seu livro, o senhor critica duramente as ações de responsabilidade social das empresas. Por quê?
Robert Reich – A responsabilidade social é uma questão de relações públicas. As empresas não foram criadas para ser instituições de caridade. E, hoje, elas têm menos condições ainda de desempenhar esse papel. Vivem numa competição tão acirrada que não podem sacrificar os ganhos de seus acionistas ou deixar de oferecer bons negócios para os consumidores em nome de algum benefício social. É ilógico fazer isso. Cria a falsa impressão de que as empresas são pessoas, com uma preocupação moral. As empresas não são pessoas. Nem instituições morais da sociedade. São pedaços de papel, acordos contratuais. O objetivo das empresas é jogar o jogo econômico da forma mais agressiva possível.

ÉPOCA – Hoje, as ações de responsabilidade social não se tornaram uma exigência do consumidor, algo indispensável para as empresas sobreviverem?
Reich – Se ajudarem, de fato, as empresas a aumentar seus lucros, então elas são práticas de boa gestão. Nesse caso, as empresas já deveriam fazer isso de um jeito ou de outro. Mas quem dá aos executivos das empresas o direito de decidir o que é do interesse público? Eu, certamente, não me sinto confortável em dar essa responsabilidade a eles. É para isso que temos leis e normas. É para isso que temos uma democracia, para determinar as regras do jogo. Esse é o propósito do processo democrático – determinar os custos e os benefícios sociais do capitalismo. As empresas não devem satisfações aos cidadãos, mas sim a seus acionistas.

ÉPOCA – O que é esse supercapitalismo a que o senhor se refere no livro?
Reich – O supercapitalismo começou a ganhar forma no fim dos anos 70, com a globalização da economia. Naquela época, a tecnologia desenvolvida para uso militar durante a Guerra Fria passou a ser usada em novos produtos e serviços. Isso facilitou o ingresso de novos concorrentes no mercado e ajudou a melhorar os transportes e as comunicações. O poder dos consumidores e dos investidores se multiplicou. Passamos a ter acesso a mais escolhas e a melhores negócios que nunca. Mas as instituições que conduziam as negociações formais ou informais para distribuir a riqueza, estabilizar os empregos e definir regras justas para o jogo, como os partidos políticos, os sindicatos e as agências reguladoras, perderam importância. O capitalismo triunfou, mas a democracia se enfraqueceu. A idéia do bem comum desapareceu.

Leia a entrevista completa publicada na revista Época