Nova Délhi — Na Índia do século XXI, marcada pela globalização e pela abertura econômica, falar de Mahatma Gandhi (1869-1948), o grande líder do movimento da não-violência que levou o país à independência, em 1947, é algo fora de moda. Hoje, ninguém parece muito interessado nas idéias de preservação do sistema de produção artesanal defendidas por Gandhi no passado. Uma exceção é o educador Sunjit Bunker Roy, de 61 anos, fundador do Barefoot College (literalmente, Faculdade dos Pés Descalços), uma ONG voltada para a melhoria das condições de vida dos mais pobres na zona rural. “Muita gente pensa que Gandhi está ultrapassado, que ele era um sujeito do século XIX”, afirma Roy. “Mas sua mensagem é universal e continua relevante até hoje.”
Criado numa família de classe média alta em Bombaim, centro econômico da Índia, Roy estudou em boas escolas, foi campeão nacional de squash e tinha tudo para seguir uma carreira bem-sucedida no setor público ou na iniciativa privada. Em vez disso, tornou-se um empreendedor social. Criou o Barefoot College, em 1972, no Rajastão, região noroeste da Índia, perto da fronteira com o Paquistão.
Por lá, segundo ele, já passaram cerca de 50 mil camponeses, semi-analfabetos, que receberam treinamento para atuar no desenvolvimento auto-sustentado de suas comunidades. A ONG ajuda a implantar energia solar, atendimento na área de saúde, captação de água da chuva e educação infantil nas aldeias. No dia 5, Roy conversou com ÉPOCA, num bar freqüentado por intelectuais e gente da alta sociedade, em Nova Delhi.
ÉPOCA – Como o senhor vê a mudança econômica e a modernização que vêm ocorrendo na Índia nos últimos anos?
Sunjit Bunker Roy – Há, na verdade, duas Índias, uma que vive nas cidades e outra que vive na zona rural. Existe uma grande disparidade entre elas. Muita gente acredita que o que está acontecendo nas cidades é a Índia. Mas, como disse Mahatma Gandhi, a Índia vive no campo. Estamos negligenciando as pequenas vilas rurais, em benefício das cidades.
ÉPOCA – Mas não saem todos ganhando quando o país cresce 8% ao ano?
Roy – O crescimento econômico, a informatização, tudo o que as pessoas ouvem sobre a Índia no Ocidente não está acontecendo no campo. Há uma grande migração para as cidades – e isso é uma tragédia. Se pudéssemos melhorar a vida dos pobres na zona rural, haveria menos migração para as áreas urbanas. Mas o atual governo não faz o suficiente para melhorar a vida dos que vivem com menos de meio dólar por dia.
ÉPOCA – O que deve ser feito?
Roy – Os políticos indianos dizem que está havendo um grande investimento no campo, em água potável, na criação de empregos. Mas essa é uma resposta simplista. É preciso dar dignidade e respeito aos camponeses. Estamos aumentando o número de médicos, engenheiros e professores nas cidades, que nunca vão ao campo. É preciso reconhecer as qualificações que os camponeses têm e procurar desenvolvê-las. Para que eles possam desenvolver a si mesmos.
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